“pelo
sumo das laranjas no ar e bicicletas,
Em
meu país de memória e sentimento,
Basta
fechar os olhos;
A
representação do alimento parece-me apropriada para costurar certos pontos das
analogias sendo que comemos também da leitura: devoramos livros quando estamos
com fome, salivamos ao contato de uma cena. Na malha de emoções e lembranças
sensoriais da infância que nunca nos abandona é que recordamos algumas dessas
representações alimentares como componentes de muitas narrativas já
incorporadas no inconsciente coletivo: a cesta que a Chapeuzinho Vermelho (azul,
cor-de-abóbora, amarelo...) leva para sua vovó, os feijões mágicos em João e o pé de feijão ou ainda o mingau
em Cachinhos dourados e os três ursos.
Percebido isto, partimos do pressuposto de COSSON (2011, p. 40) cujo pensamento
afirma que “aprender a ler é mais do que adquirir uma habilidade, e ser leitor
vai além de possuir um hábito ou atividade regular” para experienciar práticas
de leituras mediadas nas relações humanas em torno de um dos espaços mais
afetivos que há: a mesa. Surgiu aí a promoção de um “Chá literário” com as turmas do maternal e nível I e "Conversas Doces" com o nível II e o primeiro ano do ensino fundamental.
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| Fonte: http://www.huffingtonpost.ca/2012/11/13/coffee-table-books_n_2123931.html |
Anteriormente
selecionei duas obras para contação: “Menina
bonita do laço de fita” de Ana Maria Machado com ilustrações de Claudius e “Os três lobinhos e o porco mau” de
Eugene Trivizas com ilustrações de Helen Oxenbury. A primeira obra, conta a
história de um coelho branco que sonhava em ter uma filha pretinha, assim
acompanhamos suas aventuras e peripécias com a menina para descobrir o segredo
para o sucesso dessa empreitada. A segunda obra, inverte os sabidos papéis do
lobo mau e dos porquinhos, satirizando elementos atuais para reinventar a
história.
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| Foto: Detalhe das capas dos livros. |
Familiarizado
com as narrativas, apresentei e efetuei a leitura com observações das
ilustrações para as crianças. No segundo momento os convidei para um chá
literário com Os três lobinhos e o porco mau (ensino infantil) e para conversas
doces o primeiro ano do ensino fundamental ao lado da Menina bonita do laço de
fita. Pretexto para compartilharmos impressões de leitura, interpretação de
mundo, manifestações de opiniões e partilharmos dos dois tipos de alimento em
mesa: o físico, a comida propriamente dita e o espiritual, a literatura (no
caso, aqui a digestão). Mas que tipo de alimento ofertar? Bem, na história dos três
lobinhos o chá e frutas são adorados pelo trio (depois pelo porco redimido) e
posteriormente por nós (rsrs). Na história da Ana Maria, o coelhinho toma muito
café e come muita jabuticaba... mas infelizmente o excesso não o fez nada bem.
Por isso decidimos fazer algo mais doce e tradicional brasileiro: o brigadeiro!
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| Foto: No detalhe eu e a profe Ane com as crianças. Fonte: Pessoal. |
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| Foto: 1. Com a profe Roberta fazendo o brigadeiro. 2. Flagra da Morgana admirando os copinhos sendo recheados de brigadeiro! rsrs Fonte: pessoal. |
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| Foto: Com a professora Débora e a turminha do Nível II! Fonte: Pessoal. |
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Foto: Posando para a foto depois do Chá literário com a professora Lassara e a turminha do nível I.
Fonte: Pessoal. |
O comer é um ritual mágico. Comer é o impulso mais
primitivo do corpo. Preparamos os chás de flores e cortamos as frutas
(vermelhas) com as crianças. Sentimos o cheiro de a flor brotar na água (rosas?
camélias? cravos?), provamos o doce gosto do morango, da maça... Com leite
condensado também pode!!! Delícia. Todo o processo ascendendo os cinco
sentidos, no entanto sem perder nenhuma fala das crianças: “os lobinhos tinham razão”, “os lobinhos tomaram este? Eu também tomo”,
“quando eu era ‘pequenininho’ minha mãe
me dava chá também”. Nasce daí a primeira filosofia, sumo de todas as
outras: o mundo é para ser comido.
História e literatura são para serem comidas. “Sou onívoro de sentimentos, de seres, de livros, de acontecimentos e
lutas”, escreveu Neruda.
As crianças acompanharam e ajudaram em todo o processo do brigadeiro
rente ao fogão. A homogeneização do leite condensado com o chocolate e a
manteiga, a apuração do ponto e a acomodação nos copinhos. Saiu um brigadeiro
quente, cheiroso e grosso. O gosto era doce, caseiro, como as receitas
tradicionais de casa. Ao final, algumas crianças repetiam que o segredo
da menina bonita do laço de fita pra ser tão pretinha e bonita (além das
“artes de sua avó”) era ter uma mãe como cozinheira de mão cheia. Depois as
crianças levaram seus brigadeiros para as famílias provarem também e
finalizamos o encontro extasiados com estas duas
artes, Literatura e Culinária.
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| Foto: Detalhe da cena do chá em "Alice no país das maravilhas" \o/ |
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